Articulado e cronometrado, o conjunto de ações do governo e do seu partido em defesa do núcleo político do Mensalão, careceu de igual cuidado em matéria de conteúdo.

Na segunda-feira, o STF decidiu castigar com rigor o ex-ministro José Dirceu — figura emblemática do caso – incluindo o seu encarceramento por quase dois anos. Na terça, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo fez uma candente denúncia sobre as miseráveis condições em que vivem os quase 500 mil presos no país. Na quarta, o ministro-caçula, Dias Tóffoli, sugeriu converter em multa as penas que impliquem em privação de liberdade. Neste mesmo dia, a direção nacional do PT investiu pesadamente contra a suprema corte, contra os paradigmas adotados em suas  deliberações e, sobretudo, contra a sua submissão a uma imprensa sensacionalista.

Neste elenco de iniciativas nada surpreendentes, convém destacar o pronunciamento caloroso, humanitário, do ministro Cardozo que  calou fundo e a médio prazo produzirá ações mais eficazes do que a política penitenciária dos governos na última década. Ao contrário dos xiitas do seu partido, o ministro não entrou no mérito do julgamento, não o desqualificou nem contestou o Ministério Público ou o Judiciário. Sua fala teve o dom de relembrar a manifestação do antecessor, Tarso Genro, quando em 2005 teve a ousadia de propor a re-fundação do PT.

Legítimo o desconforto do PT e de certas alas do governo federal diante do inédito rigor das condenações, compreensíveis sua perturbação e revolta. Mas ao investir contra o colégio de magistrados onde milita uma maioria esmagadora de indicados por presidentes petistas, os indignados estão tentando emplacar uma noção de lealdade, tipo “toma lá, dá cá”,  não muito distante da corrupção moral.

Embora o ceticismo no tocante ao comportamento da imprensa seja salutar, a nova ofensiva contra a imprensa é descabida. Quem está escancarando há mais de 100 dias o circo de horrores contido na Ação Penal 470 é uma emissora estatal, a TV-Justiça, cujo sinal é captado e reproduzido por uma emissora privada, a Globo-News.  A necessidade de tornar nosso judiciário mais transparente é antiga reivindicação dos setores mais liberais e progressistas da nossa sociedade.

Os detratores  da suprema corte e do ministro-relator esquecem que, na próxima quinta-feira, Dilma Roussef, primeira mulher a ocupar a Presidência da República, deverá comparecer à posse de Joaquim Barbosa, primeiro negro a ocupar a chefia do Judiciário. Ambos indicados pelo presidente Luís Inácio Lula da Silva. Contrariados e sinceramente magoados, terão que conviver para sempre com o novo capricho do Destino.